Entidade contesta decreto que regula o tema e aguarda julgamento da ação no STF, marcado para 16 de agosto

A Sociedade Rural Brasileira (SRB) apresentou aos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) memoriais contestando a constitucionalidade do Decreto Federal nº 4.887/2003, que trata da desapropriação de imóveis rurais privados para a criação de territórios quilombolas. A SRB participa como amicus curiae da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3.239, que será debatida no STF no dia 16 de agosto.O julgamento sobre a validade do decreto está empatado no Supremo em um a um. Em 2012, o então ministro e relator do caso Cezar Peluso acolheu o pedido e votou pela inconstitucionalidade do decreto. Já em 2014, a Ministra Rosa Weber apresentou voto-vista para divergir do relator, defendendo a constitucionalidade. O julgamento foi suspenso em virtude de novo pedido de vista, feito pelo Ministro Dias Toffoli, que deve apresentar seu voto e desempatar a questão no dia 16.

Para a SRB, o decreto se transformou em um grande fator de insegurança jurídica no campo, razão que deve sustentar sua anulação pelo STF. “O decreto tem induzido a fraudes e conflitos fundiários que não correspondem à proteção dessas comunidades tradicionais”, diz o presidente da entidade, Marcelo Vieira. Segundo o dirigente, os quilombolas devem ser protegidos e ter suas terras tituladas desde que o procedimento respeite a Constituição Federal. “É inadmissível criar, a pretexto de proteção das comunidades quilombolas que deixaram de existir, conflitos fundiários para a desapropriação de imóveis produtivos, protegidos pela Constituição Federal”, reitera o presidente da SRB.

O decreto 4.887 foi editado em 20 de novembro de 2003, em meio a um conturbado ambiente político, como promessa partidária do então presidente Luís Inácio Lula da Silva. O objetivo era regulamentar o Art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que impõe ao Estado o dever de reconhecer a propriedade definitiva e emitir os títulos aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras. Segundo o advogado especialista em direito agrário Francisco de Godoy Bueno, Vice-Presidente da SRB e que assina a manifestação da entidade no STF, “há evidente vício de origem, já reconhecido pelo Ministro Cézar Peluso”. Para Godoy Bueno, a demarcação dessas áreas não deveria ter sido regulamentada por um decreto presidencial, mas, sim, atendendo ao processo legislativo.

Na avaliação da SRB, é arriscado que a norma editada pelo ex-presidente Lula tenha ofendido a garantia ao direito de propriedade, criando uma nova modalidade de desapropriação, não prevista na Constituição Federal. “A constituição só admite a desapropriação por necessidade ou interesse público ou interesse social para reforma agrária, não há previsão constitucional para a desapropriação de imóveis privados já titulados para a criação de territórios quilombolas”, analisa Godoy Bueno.