Um projeto de lei em discussão no Congresso Nacional está colocando em risco avanços importantes que o setor privado vem obtendo na resolução de conflitos por meio do mecanismo conhecido como arbitragem. O alerta foi feito durante reunião do Comitê Jurídico da Sociedade Rural Brasileira (SRB), que contou com a participação de Thiago Marinho Nunes, Doutor em Direito Internacional e vice-presidente de agronegócio da CAMARB – Câmara de Arbitragem Empresarial do Brasil. 

A lei da arbitragem, promulgada em 1996 e cuja constitucionalidade foi declarada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2001, permitiu que empresas privadas dos diferentes setores da economia encontrassem um mecanismo mais rápido e eficiente na solução de conflitos, que funciona não apenas como uma alternativa ao poder judiciário – muitas vezes sobrecarregado – mas também como o melhor caminho para que haja um alinhamento às regras internacionais que tratam do tema. 

O especialista Thiago Marinho Nunes disse que o Brasil é o segundo país que mais tem processos de arbitragem registrados junto a International Chamber of Commerce (ICC, na sigla em inglês), também conhecida como CCI. Foram registrados mais de 1000 casos em 2021 no Brasil, considerando as principais câmaras brasileiras. E o agronegócio brasileiro é um dos setores que vem utilizando a arbitragem de forma intensa, já que é player importante globalmente e os acordos, com frequência, envolvem empresas com sede em diferentes países.

“Normalmente as empresas estrangeiras preferem utilizar a arbitragem porque se trata de um foro neutro, não envolve o judiciário do seu próprio país, ou do país no qual se encontra a contraparte, algo que pode alongar a solução do conflito”, explicou Marinho. 

Projeto de Lei

Os avanços recentes, porém, estão ameaçados, na opinião de especialistas. Está tramitando no Congresso Nacional o Projeto de Lei (PL) 3.293/21, de autoria da deputada Margarete Coelho (PP-PI), que propõe quatro mudanças principais na lei de arbitragem e “podem ser nefastas para o agronegócio”, destacou Thiago Marinho Nunes.

Uma delas está relacionada à confidencialidade. Pelo projeto, duas partes que queiram resolver alguma pendência por meio da arbitragem passarão a ser obrigadas a divulgar publicamente os detalhes particulares da questão. A proposta é criticada porque a opção dos agentes privados por este mecanismo muitas vezes está baseada no fato de se tratar de assuntos confidenciais das empresas, que só a elas interessa. Outro item pretende estabelecer que cada profissional de arbitragem atue em no máximo 10 procedimentos. Um terceiro ponto fala que o profissional não pode estar em diferentes painéis com distintas posições, o que hoje é comum nesta área. Por último, trata de um conceito chamado de “dúvida mínima”, que na prática também restringiria a atividade destes profissionais, que costumam dar palestras, interagir em diferentes fóruns, e que agora ficariam sob o risco de serem acusados de algum tipo de conflito de interesse. 

“Caso um projeto como esse seja aprovado, nosso temor é que a arbitragem gradativamente caia em desuso, retomando processos demorados junto ao poder judiciário e comprometendo a segurança jurídica do agronegócio”, explicou Marinho. Muitas empresas estrangeiras só fazem negócios com players que aceitem a cláusula de arbitragem, sendo assim, eles poderiam desistir de alguns projetos, ou mesmo exigir que o foro de arbitragem seja designado fora do Brasil, o que encareceria, por demasiado, o procedimento. 

A reunião do Comitê Jurídico da SRB foi liderada pela advogada Silvia Castro Cunha Zono e pelo advogado Gabriel Hercos e contou com a participação de diferentes empresários e diretores da entidade.