*Por Marcelo Vieira

O acordo entre Mercosul e União Europeia, oficializado no fim de junho pelo governo brasileiro, pode abrir portas para uma nova era do nosso agronegócio. Antes de tudo, é histórica sua conclusão após 20 anos de longas negociações. Além disso, representa um passo importante rumo ao processo de modernização e abertura econômica para o Brasil. Trata-se de um empurrão que tira o Mercosul da zona de conforto, aproximando o bloco de um mercado consumidor importante. É preciso ponderar, no entanto, que o tratado, sozinho, não assegura a expansão das exportações nacionais.
Segundo o Ministério da Agricultura, produtos agrícolas de interesse do Brasil terão suas tarifas eliminadas, como suco de laranja, frutas, café solúvel, peixe e óleos vegetais. Exportadores brasileiros também terão acesso preferencial para carnes bovina, suína e de aves, açúcar, etanol, arroz, ovos e mel. Já o Ministério da Economia calcula que a economia brasileira vai ter um impacto positivo de US$ 125 bilhões em 15 anos com o acordo. As previsões são altamente positivas, mas é preciso cautela ao avaliar se os produtos brasileiros de fato conseguirão atingir o aceso que almejávamos.
Sempre houve uma cautela especial do Mercosul em concluir o acordo, já que as contrapartidas obtidas pelo bloco precisariam ser compatíveis às garantias à União Europeia, que passaria a explorar um amplo e crescente mercado consumidor. Com a oficialização do tratado, é notório que algumas cotas agrícolas são basicamente as mesmas que os europeus ofereciam há duas décadas, ainda longe da nossa pretensão inicial. Estão ainda abaixo do esperado sobretudo as menos de 100 mil toneladas para carne bovina.
Nesse sentido, são especialmente importantes as cláusulas de renegociação nos volumes das cotas agora negociadas. Devemos considerar, antes de tudo, que a economia do Mercosul deverá crescer, o que, consequentemente, ampliará o tamanho do mercado obtido de forma preferencial pelos europeus.
Outro ponto preocupante é um possível “princípio de precaução”, que dá à UE a possibilidade de impor barreiras e restrições sem fundamentação científica caso o Mercosul não consiga provar que as exportações são livres de danos. Este pode ser um precedente perigoso na questão ambiental, aonde as verdades são mais complexas de provar. Cabe ressaltar que a versão europeia não cita abertamente a existência de um “princípio da precaução”, mas lista o Acordo de Paris e a Moratória da Soja como práticas que serão observadas no acordo. Falta clareza neste ponto do acordo e o Brasil pode ter se comprometido com algo que não possa fazer.
Apesar das ponderações, é preciso reconhecer que a retirada completa ou parcial das tarifas melhora a competitividade dos produtos brasileiros em relação a concorrentes. Nos últimos anos, países como México, Canadá, Austrália e Indonésia vinham firmando bons acordos comerciais e ampliando significativamente a participação no mercado mundial. As reduções tarifárias para alguns produtos são relevantes e nos colocam em pé de igualdade com esses países exportadores. É importante comemorar o acordo, que pode não atender a todas nossas necessidades de uma boa relação comercial com os europeus, mas inicia um novo relacionamento que deverá ser renegociado sempre que possível.

*Presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB)